segunda-feira, 3 de maio de 2010

De como curei um garoto - Parte II

Após iniciar o tratamento do garoto, deixei-o lá, a soltar bofes no roseiral recentemente podado. Minha astúcia chegava a tal ponto que, concomitantemente à cura de uma grave enfermidade, descobri uma nova maneira de fertilizar a terra para o cultivo de flores, que de fato nasceram maiores, apesar de o vermelho típico daquela espécie ter passado a pender mais para o ocre dali em diante.

Ao entrar no interior da casa, procurei, antes de tudo, a empregada, a quem encontrei faceira a lavar pratos na cozinha. “Fez um ótimo trabalho, chou chou” (que é chu-chu, em francês). Ela encarou-me, de cima abaixo, virando apenas a cabeça e os olhos em minha direção, o que dava um entortar todo sensual à sua coluna e a suas nádegas (isso talvez ocorresse por conta de sua lordose, nunca saberemos). O importante é que ela despertava, em mim, o velho instinto doutros tempos.

Eu iria me dar bem...

“E então, Dr. Patrides!” irrompeu estridente a viuvinha. “Como vai meu filinho!? Está reagindo bem ao tratamento?”. Ajeitei-me tanto quanto pude no susto, sentando-me rapidamente com as pernas cruzadas num tamborete ali mesmo na cozinha, buscando esconder minhas vergonhas. Então tomei fôlego e respondi com frieza.

“O rapaz está colhendo os doces frutos da cura. Não há dor nem mal estar. Ocorre que o extrato está agindo bem, expulsando, em meio às excrescências líquidas do corpo, os pérfidos rumores que lhe causaram a maleita”.

“Ah, Patrides, o senhor é mesmo um anjo em minha vida. Acordo, muitas vezes, acalorada e saudosa, a lembrar das tantas assistências, ou daquela”, interrompeu a fala para uma enigmática para piscadela, “e das inúmeras outras que o senhor tem prestado à minha família, tão sensível após a passagem de meu amado esposo”. E me olhava com ar libidinoso, de um lado, enquanto a serviçal, por percebê-lo, fazia um muxoxo, do outro, e deixava a nádega bem empinadinha (lordose?).

“Querida”, disse muito educadamente à senhorita empregada, “sirva-nos, por gentileza, duas taças de vinho rosé”. Ela secou as mãos com certa impaciência e saiu às pressas, arrastando o salto plataforma pelo chão, passando como se não me notasse.

“Minha cara senhora”, disse eu à viuvinha, “não agradeça a mim, que lhe sou servo. Deve sempre contar com minha experiência nos momentos de necessidade, viu? E não aceito nenhum ‘não’ como resposta”, disse aproximando-me para beijar-lhe a mão, o que fiz com sutileza, enquanto encarava-lhe sem piedade nas faces coradas de desejo, já sem o pudor da perna cruzada e com as vergonhas em riste.

“Aqui está”, disse a criada com secura, fazendo estalar duas taças de vinho na mesinha da cozinha e indo direto a seus afazeres, como se não existíssemos, sua senhora e eu mesmo. “Brindemos”, disse eu, com taça na mão, à viuvinha, que, sorridente, tilintou a sua na minha, de modo que o líquido escorreu um pouco. Ela engoliu tudo duma vez enquanto eu sorvia a breves goladas, encarando-a sem discrição nos olhos.

Dentro em pouco percebemos que o garoto vinha cambaleando na sala e ouvimos os sons de seus tropeços. Fomos até lá para assisti-lo, verificar se precisava de minha ajuda profissional. “Que diabo foi isso que o senhor meu deu!? Essa porra não dá barato nenhum!”

Sua voz era clara e firme, conquanto nervosa. O extrato começava a fazer seus primeiros efeitos.

“O extrato começa a fazer seus primeiros efeitos”, afirmei.

(continua)